Ver na capa da revista LB 45, mais abaixo, a imagem do poeta.
WALTER SAMPAIO
( Brasil – Bahia )
Nascido em Aracaju, a 14 de janeiro de 1923, Walter Mendonça Sampaio, filho de Oswaldo e Irinéa, tio e sobrinha, tiveram cinco filhos: Nilza, Neuza, Walter, Aluysio e Maria.
Walter teve atuação destacada na literatura sergipana no final dos anos 30 e durante toda a década de 40. Em 1939, juntamente com Armindo Pereira, dirigiu Mensagem, jornal literário que se propunha a ser "um novo propagador do modernismo". Apesar de editado em pleno Estado Novo, vinha o jornal com forte carga democrática e trazia vários artigos contra o fascismo. Com seu espírito inconformista, Walter, juntamente com José Nunes Mendonça, José Maria Menezes Campos e Armindo Pereira, lançaram Símbolo, outro jornal literário, com características semelhantes ao anterior.
Geração dos Novos – Com o mesmo sentido de renovação modernista da literatura em Sergipe, Walter Sampaio foi um dos fundadores, em 1942, de Mensagem dos Novos de Sergipe, associação de caráter cultural que congregou um grupo atuante: Paulo de Carvalho Neto, José Amado Nascimento, Aluysio Sampaio, José Maria Fontes, Sindulfo Barreto Filho, José Sampaio, Luciano Lacerda, Lindolfo Campos Sobrinho, Álvaro Santos.
Radicado em São Paulo, desde o início do século 50, Walter Sampaio publica vários artigos opondo-se ao formalismo.
LB 45 revista da literatura brasileira. Direção: Aluysio Mendonça Sampaio. São Paulo: 2007. 48 p.
Ex. bibl. Antonio Miranda
Mensagem a um jovem poeta morto
A Enoch Santiago Filho
Ofereço ao silêncio da noite
as vozes de meu canto desesperado
e à luz mansa da estrela
o brilho de minhas lágrimas.
Ofereço a ti, Poeta, a presença da saudade
e estes versos de tecido invisível.
Na amargura que desce sobre nossos olhos
na agonia de nossa pequenez face à morte imponderável
eu divisarei teu vulto inquieto.
Na aurora que se levantará sobre o mundo angustiado
em que viveste, eu te divisarei,
nas flores que renascerão no seio da grande harmonia
na luz da madrugada que secará os cabelos da noite
molhados das lágrimas do mundo
nos braços de espumas de mar
que se levantarão para colher a última luz
na compreensão de que chegamos à outra margem
do tempo e do espaço, eu te divisarei.
Quando o pássaro da manhã acordar o mundo
para a vida que chega
todos os que sobreviveram, numa absoluta compreensão
guardarão um minuto de silêncio
que será teu, Poeta,
porque compreenderão que teu pensamento
foi um facho de esperança iluminando a densa noite
da descrença, da inércia e da injustiça.
O teu olho morto na terra escura
verá erguerem-se contra a grande obsessão
milhares de homens iguais a ti.
Na hora da redenção verás os campos cultivados
as cidades dormindo no aconchego da noite
os homens correrem alegres nos campos
como animais soltos no pasto.
Verás os ventos acariciarem as mulheres perdidas
e todos encherão as mãos com a água do rio
que voltou a correr.
Ouvirás o rumor de raízes crescendo
e os ventos cantarem na tua sepultura
a canção que gostarias de ouvir da boca do povo.
Sentirás nas entranhas
O calor dos animais dormindo sobre a relva.
Verás a estrela descer do céu
e estender lume de prata sobre a tapera.
Ouvirás uma voz cantando no silêncio do beco
e então compreenderás que chegou o momento
da nova poesia descer ao coração dos homens.
Chegará o momento em que nossa voz descerá aos túmulos
para falar aos que morreram
e então será a tua vez.
Chegará o momento em que iremos todos
à presença dos que tiveram nos lábios
a palavra de salvação
e então chegará a tua vez.
—Isto quando vier o instante esperado
pelos que passaram a noite em vigília
encobertos pela angústia do mundo.
—Isto quando chegar o momento
em que uma força nova animará
os que tiveram palavras desencantadas
e pensarem na inutilidade da vida.
Porque é preciso que a paz encontre ainda vivos
os que perderam a esperança nos caminhos do mundo.
Mas agora, Poeta, estás dormindo no ventre da terra
morto como tantos dos teus irmãos
fecundando o silêncio da morte
esmagado pelo peso do mundo
distante do dia que nascerá.
Silêncio! Silêncio!
As água do rio Spee choram
O corpo mutilado de Rosa Luxemburgo.
Silêncio!
Garcia Lorca repousa num cemitério de Granada.
Silêncio!
É a voz de Antonio Machado que vem do fundo da terra.
Silêncio! Outro poeta desceu ao silêncio da morte!
Eles aguardam o momento da vida
E um dia descerão na luz que acordará o novo mundo.
A ROSA E O ENIGMA
A madrugada lá fora
anda quebrando vidraças
e abrindo janelas nas águas furtadas.
Entre o chão e o teto
contorcida escada de madeira.
Pássaros mortos
atapetam a soleira do quarto.
Mãos avançam peremptoriamente
como se atraídas pela refração da manhã
quisessem desligar-se do corpo
cansado pela vigília.
Vontade de decifrar enigma.
Enquanto o pensamento estremece
esmagado, nas pálpebras cansadas
a rosa da noite desfaz pétalas roxas
no parapeito cinzento da janela.
*
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Página publicada em janeiro de 2023
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